sábado, 21 de junho de 2014

Dor

Nunca demorei tanto para transcrever qualquer sentimento, já fazem sete dias, nem parece real, ainda me sinto em um mundo entre o imaginário e o real, segurar a certidão de óbito do meu pai em mãos, ter as fotos minhas que ele sempre carregou na carteira devolvidas, que não vão estar mais lá pra ele mostrar, fizeram um buraco na hora que tocaram em minhas mãos, sempre vou ser a princesinha do meu pai.
Sempre escrevi algo, me apaixonei e transcrevi milhares de palavras em qualquer lugar, não é por acaso que eu ando sempre com papel e caneta, me senti alegre, e as folhas de meu caderno devocional explodiram em sorrisos, me senti triste e o potinho de sentimentos do meu quarto se encheu de bilhetes para mim mesma, me senti agraciada por Deus e ouvir sua voz me fez escrever milhares de cartas para Ele, meu pai cumpriu seu tempo na terra e os sentimentos se transformaram em  uma dor que transbordou meus braços em roxos, marcas, mas ainda não tinha conseguido falar do sentimento para mim mesma, a dor de perda eu não estou acostumada, não fui acostumada a perder, não fui treinada para isso, tinha consciência disso, mas uma frase do meu ai ecoa em minha cabeça: "Você só não consegue aquilo que não tenta, só é difícil se você não dedica tempo para tornar fácil", lembro uma outra frase de alguém que amo, minha tia disse: precisamos sentir a dor, toda ela, vivemos para sentir.".
Esta hora eu descubro que a dor não diminui, que o buraco no peito dói, que a saudade vem recheada de lembranças e as perspectivas de futuro podem ficar frustradas, e a dor de não poder realizar sonhos, de ver meu pai em meu casamento, de saber que não poderei dançar com ele, de saber que perdi a presença de alguém que eu não queria abrir mão, que preferia sempre ele comigo, essa dor é presente, mas tenho a honra de ser filha de um pensador, de alguém que imprimiu caráter em mim, de alguém que sempre me fez andar com as minhas próprias pernas, que me ensinou a andar de bicicleta, do mesmo jeito que leu junto comigo vários dos meus romances preferidos, que não vou esquecer de quando lia a bíblia nas noites comigo, uma história por vez, de quando li "robinson crusoé" na cama dos meus pais, de quando deixou eu aprender a mexer no computador no escritório dele, de quando me ensinou a ver o mundo como eu vejo, não consigo nem escrever tudo o que meu pai me ensinou, porque cada dia eram lições novas, não me arrependo de ter passado seis horas sentada estudando física, matemática com ele, sei que ele colocou asas na minha cabeça com seus exemplos de solidariedade, sou fruto das marcas que ele deixou em mim, se sou quem sou, devo muito a ele, um pai diferente provavelmente não teria dado tanto do seu tempo pra mim.
Não me entrego a dores, sentimentos são transformadores para mim, sentimentos me fazem crescer, já disse milhares de vezes que meu coração dá asas a minha cabeça, mas não tem como não deixar de sentir.
"Nunca esperei ter que crescer tanto, tão rápido, tão cedo."

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